Em nome da CUDAP – Comissão de Utentes para Defesa da Água Pública dou-vos as boas vindas ao I Encontro para as Questões da Água. Este encontro é o culminar de um trabalho de quase um ano dedicado a divulgar o conceito que temos sobre o negócio das águas que se promove nos nossos concelhos – Carregal do Sal, Mortágua, Santa Comba Dão, Tábua e Tondela.
Quando em 2005 a Águas do Planalto fechou todos os fontenários ligados à rede de abastecimento público, a indignação para com esta empresa chegou a um novo patamar. Os sinais de prepotência e busca desenfreada de lucro a que a privatização das águas abriu caminho tinham já dado sinal de si aquando de um inverno particularmente frio. Nessa altura alguns contadores de água rebentaram devido ao gelo que se formou no seu interior. A empresa foi lesta em cobrar 110€ pela reposição de cada um deles aos utentes afectados. Contadores esses que eram propriedade da empresa, pois por isso é que pagávamos mais de 45€ por ano pelo seu aluguer.
Depois destas situações, e com um novo olhar sobre todo este negócio, outros fenómenos se foram revelando. A cada nova “descoberta” revelava-se mais e mais o espírito mercantilista desta empresa face à água que é de todos nós. Desde o encerramento dos postos de atendimento que havia na sede de cada município, até à imposição duma sobretaxa de 1€ por mês para financiar o deslize orçamental verificado na construção da barragem do Paúl, tudo parecia meio válido para esta empresa ganhar dinheiro. A última destas maravilhas é os garrafões de água da torneira que a empresa vende na sua sede por €0.56, o que equivale 112€ por m3.
Perante tudo isto um grupo de utentes uniu-se em torno duma causa comum com a intenção de perceber o que se passava e tentar combater esta exploração. Assim, em Janeiro de 2007 surge a Comissão de Utentes para Defesa da Água Pública.
Como forma de consolidar a luta e perceber melhor toda a extensão dos problemas a CUDAP promoveu um conjunto de Sessões de Esclarecimento que tiveram lugar em mais de 25 Associações Populares fazendo assim ouvir a sua opinião, mas mais importante, auscultar os problemas enfrentados pelas populações à conta desta empresa.
Procurando encontrar uma válida justificação legal ou contratual para todos os problemas que foram identificados, a CUDAP decidiu obter o famoso contrato de concessão. Facilmente se descobriu que esta empresa nada tinha contratado com os municípios. Todo este negócio tinha sido elaborado sob a égide da Associação de Municípios do Planalto Beirão. O dever que é das Câmaras de repente aparecia, sem qualquer aviso, nas mãos desta entidade associativa.
Sabendo quem o contratante, restou à CUDAP requerer, ao abrigo da Lei de Acesso aos Documentos Administrativos, cópia do contrato. A Associação de Municípios levou mais de meio ano a entregar uma cópia, e ainda assim incompleta, deste documento, e só o fez após algumas peripécias legais. A relutância em dar a conhecer ao público a base escrita de todo este negócio faz bem perceber que algo se quer esconder.
A CUDAP, após quase dois anos de actividade organiza o seu I Encontro Sobre as Questões da Água. Aqui vamos ouvir o relato de várias experiências e visões sobre o que é a Água Pública.
Exmos. Srs.
Presidente da República
Presidente da Assembleia da República
Presidentes da Bancadas Parlamentares
Presidentes das Câmaras Municipais de Carregal do Sal, Mortágua, Santa Comba Dão, Tábua e Tondela
Presidente da Associação Nacional de Municípios de Portugal
Presidente da Associação Nacional de Freguesias
Moção em Defesa da Água Pública
Os presentes no Encontro da CUDAP realizado em Mortágua em 6 de Dezembro de 2008 decidem:
Mortágua, 6 de Dezembro de 2008
Exmos. Srs.
Presidente da República
Presidente da Assembleia da República
Presidentes da Bancadas Parlamentares
Presidentes das Câmaras Municipais de Carregal do Sal, Mortágua, Santa Comba Dão, Tábua e Tondela
Presidente da Associação Nacional de Municípios de Portugal
Presidente da Associação Nacional de Freguesias
Moção pela Gestão Pública da Água
Mortágua, 6 de Dezembro de 2008
Em 1997 a água dos nossos 5 concelhos – Carregal do Sal, Mortágua, Santa Comba Dão, Tábua e Tondela – começou a ser comercializada pela Águas do Planalto. Mas esta negociata começa antes. Ao ceder os seus direitos e enjeitar os seus deveres na distribuição de água ao domicílio em prol Associação de Municípios da Região do Planalto Beirão as Câmaras colocavam fora da esfera do escrutínio público os negócios que se viriam a fazer com o que já foi chamado de Ouro Branco.
«Longe dos olhos, longe do coração» – como diz o povo – as autarquias foram livres, através da Associação de Municípios, de negociar como bem lhes apeteceu esta concessão. Servindo-se deste intermediário nenhuma das decisões relacionadas com a entrega deste recurso público à esfera privada foi alvo de decisão nas Assembleias Municipais – órgão com competências para decidir sobre os destinos dos municípios.
A opção pelo modelo empresarial começa por ser estranha desde o início. A coincidência de para uma nova oportunidade de negócio aparecer prontamente uma empresa é no mínimo intrigante. Esta empresa, criada do nada, surge como gestora de um sistema nalgumas zonas já instalado e noutras em fase de projecto ou instalação. Absorve, por empréstimo, parte dos quadros dos serviços municipais de águas bem como todo o seu conhecimento e capacidade técnica.
Com um mercado assegurado e mão-de-obra qualificada restava à Águas do Planalto começar a facturar. A esta empresa recebe de mão beijada direitos de exclusividade da distribuição de água para a nossa região. Assim esta empresa é brindada com um monopólio sobre o qual a única preocupação que tem é a de controlar consumos e facturar águas, sem que para isso tenha feito investimento digno desse nome. Todas as competências necessárias ao funcionamento desta empresa encontravam-se já ao dispor dos municípios.
A única novidade que esta empresa trouxe à distribuição de água ao domicílio foi uma visão exclusivamente mercantilista dum serviço que se quer público.
Para além de receber toda a capacidade de trabalho da parte das autarquias esta empresa recebeu desde logo, da parte da concedente, uma encomenda de 17 milhões de euros em obras para iniciar funções. Obras estas das quais a empresa geria a construção. O fim da gestão deste tipo de obras provocou de 2005 para 2006 uma redução de perto de um milhão e meio de euros nos resultados operacionais da empresa.
Quando em 2007 este contrato foi assinado, o seu prazo de duração era de 15 anos – até 2013. No decurso deste ano esta situação foi alterada, sendo o prazo da concessão prorrogado por mais 15 anos, somando agora um total de 30 anos de contrato. Com o anúncio do prolongamento do prazo inicialmente acordado foi-nos dito pelo Sr. Presidente da Câmara de Tondela que para abandonar o contrato as Câmaras teriam que despender de 12,5 milhões euros.
Uma consulta ao contrato de concessão permite-nos facilmente perceber que esta não pode ser a verdade. De acordo com o que está contratado a concedente pode denunciar o acordo contando que tenha decorrido um terço do prazo da concessão. Para isso basta avisar com um ano de antecedência e compensar a empresa em 5% do valor da facturação de água por cada ano restante até ao final da concessão. A valores actuais esta restituição rondaria somente os 2 milhões de euros.
Mas voltando um pouco atrás. Uma das tais obras foi a Barragem do Paúl. Esta obra que deveria ter custado 29 milhões de euros acabou por custar 48 milhões. Este foi um deslize de 65%... Assim já desde algum tempo a esta parte que todos os meses pagamos a já famosa “sobretaxa do artigo 21 do contrato de concessão” no valor de 1€. Esta sobretaxa, que reverte para a Associação de Municípios totaliza cerca de meio milhão de euros por ano.
Com este processo a culpa, uma vez mais como é moda no nosso país, morre solteira. Os responsáveis por enorme deslize orçamental nunca serão chamados à razão e os prejuízos daí resultantes imputados ao utente deste serviço. Este meio milhão de euros, corrigidos anualmente à taxa de inflação – como acordo assinado em 2006, ao longo dos 20 anos reminiscentes do contrato vão possibilitar à Associação de Municípios da Região do Planalto Beirão o encaixe certinho para anular a asneira que a empresa cometeu ao gerir aquela obra. É no mínimo de estranhar esta solidariedade e cumplicidade entre concedente e concessionário.
Mas mal contentes na sua contenda de obtenção de lucro a empresa, não estando impedida de o fazer, decide encerrar todos os fontenários que estivessem servidos pela rede pública. A justificação apresentada para tal atitude prendia-se com o excesso de água que era consumida nestes pontos de água pública. Após pronta intervenção das populações, com deslocação a Mortágua do deputado Bernardino Soares, as autarquias comprometeram-se a reabrir um fontenário por povoação mas com colocação de contador. As facturas, essas são ao encargo das Juntas de Freguesia. No entanto, e para evitar qualquer contestação, os 5 presidentes de Câmara passam a suportar esta nova dívida através duma transferência de fundos para as freguesias. Após mais esta manobra a empresa passou a encaixar mais uns cobres com o aluguer de mais uns quantos contadores.
Recentemente com a proibição do aluguer dos contadores, que rendiam mais de 2 milhões de euros à empresa por ano, este esquema de gestão mercantilista deu mais um ar de sua graça ao substituir a cobrança ilegalizada por uma nova e mais dispendiosa Taxa de Disponibilidade. A empresa, seguindo uma orientação do IRAR que faz tábua rasa da lei, encontra justificação para uma parcela fixa na nossa factura. Isto acontece mesmo após o Secretário de Estado do Consumidor ter referido que é ilegal a cobrança de taxas de disponibilidade que um conjunto de empresas se preparava à altura para fazer.
A água é um bem essencial à vida humana. O livre acesso a este recurso deve ser garantido por todas as formas possíveis. Ficou aqui já demonstrado que a solução empresarial é por si a má solução, quanto mais quando os contratos que estabelecem essas concessões são altamente permissivos e cegos aos direitos dos utentes. Assim de à CUDAP só resta exigir aos senhores Afonso Abrantes, Atílio Nunes, Carlos Marta, Ivo Portela e João Lourenço que se ocupem de fazer retornar de imediato a distribuição de água às mãos das autarquias, de onde nunca devia ter saído.
6 de Dezembro de 2008, Mortágua, sede do Rancho "Os Unidos", 15h00
A CUDAP continua a sua luta contra a exploração praticada pela empresa Águas do Planalto ao abrigo do Contrato de Concessão. Assim, dia 6 de Dezembro, a CUDAP promove o I Encontro Sobre as Questões da Água.
Para este encontro a CUDAP convidou um conjunto alargado de pessoas oriundas das mais diversas zonas e com um lote alargado de experiências para falar connosco sobre as Questões da Água.
Intevenções confirmadas:
Baltazar Almeida - Balflora, Secretariado dos Baldios do Distrito de Viseu
Jorge Fael - Comissão de Utentes em Defesa da Água, Covilhã
José Catalino - STAL, Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local
Mário Lobo - CUDAP
Nuno Vitorino - Associação Água Pública